A Luz se Apaga

Imagem criada e editada por Sara Melissa de Azevedo para o Castelo Drácula

O céu estava negro e denso como minha alma, mas uma estrela de esplendor singular havia me cativado. Brilhava alheia à escuridão que a cercava. Sentada no parapeito da janela do meu quarto, assistia a esse espetáculo noturno.

Malus adentrou o recinto e direcionei meu olhar para a porta. Questionou o que fazia sozinha àquela hora. Quis mostrar a estrela esplêndida que me roubara toda a atenção, mas para meu desalento, já não a via mais no céu. A escuridão parecia ter engolido a luz que tanto me fascinara.

— Estava ali agora mesmo! Diferente de todas que já havia visto. — Suspirei em descontentamento.

Ele acariciou meu rosto, como se tentasse me consolar. Olhou-me ternamente; seus olhos eram como bálsamo para mim. Ainda com sua mão gélida sobre minha face, observou o céu pela janela e disse, enfim:

— Mesmo que efêmeras, as coisas que tocam a nossa alma têm o poder de deixar marcas que perduram para sempre.

Ele tinha razão. Jamais esqueceria toda a beleza daquela cena. A súbita partida daquela estrela fez-me recordar minha irmã. Assim fora com ela, tão bela e tão pura, mas ceifada de forma tão inesperada por mim mesma. Talvez eu seja de fato uma parte grotesca deste mundo...

— Desculpa? — Questionei. Malus falava enquanto eu estava perdida em meus pensamentos e não pude compreender.

— Vamos! Pegue minha mão. A noite não deve ser desperdiçada.

Aceitei o convite e saímos do castelo. Andamos por uma estrada de terra batida cercada por carvalhos, todos dispostos em fileiras, milimetricamente separados uns dos outros. Ao final, um imponente e ornamentado portão de ferro se fazia guardião de um cemitério antigo, o qual eu ainda não conhecia.

Meu companheiro tirou um singelo molho de chaves de seu sobretudo, pegou uma chave com uma cruz dourada entalhada e abriu a fechadura sem dificuldade. Passamos pelo portal.

A beleza das esculturas centenárias era de uma grandiosidade que não encontro palavras para expressar. Caminhei por entre altas lápides e dancei sobre sepulturas. O brilho único de uma estrela e aquela adorável galeria de arte me faziam sorrir como uma criança.

— Venha. Sente-se aqui. — A voz risonha deixava evidente que se divertia às minhas custas.

— Não ria! — Sentei-me junto a ele nas escadas de um mausoléu de mármore branco que tinha o portão aberto.

— Trouxe seu diário e meu caderno de esboços. Teremos nossa própria noite erudita.

Malus era um artista. Seus desenhos eram impressionantes. Amávamos passar o tempo no castelo com nossas artes; esta seria a primeira vez em um lugar diferente. Em seus esboços naquela noite, ele registrou as mais variadas paisagens. Desde uma árvore reduzida a tristes galhos até mesmo eu, sentada naquele descanso eterno de não sei quem, distraída, escrevendo e sonhando acordada. A forma como as lápides soavam no papel era extasiante, mas ainda não se comparava ao fascínio que proporcionavam a olho nu.

Foi uma noite inigualável. Poética, reflexiva... fiz anotações em meu diário e escrevi poesias; não poderia me negar a elas. Podia sentir no paladar... a escuridão é saborosa, a poesia é como um beijo suave de língua. E o Castelo Drácula sabe disso. Ele vive, respira e inspira arte. Se você adentrou aos portões, sabe muito bem onde encontrar cada um dos meus versos...

Até breve!

Texto publicado na 8ª edição de publicações do Castelo Drácula. Datado de agosto de 2024. → Ler edição completa

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