Imagem criada e editada por Sara Melissa de Azevedo para o Castelo Drácula

No porão úmido daquela casa, o aroma mórbido de mofo consumia minhas narinas, mesmo e apesar da máscara sobre meu rosto. O corpo estendido no chão era só mais um, asfixiada por uma corda de juta após ser presa e sedada. Rápido e indolor. “Ela precisa morrer essa noite, caso contrário, eu perco tudo o que conquistei durante todos os últimos vinte anos.” — Foi o que ouvi do contratante. Que vida efêmera. Que vida frágil. A podridão das circunstâncias e o caos do acaso. Setenta mil reais em criptomoedas na minha conta no dia seguinte, sem vestígios, isso é o que me importava.

No entanto, a chuva aumentara de modo estranho naquele momento, demais para um inverno comum. Subi as escadas do porão e a cabana parecia mais escura do que antes. Caminhei em silêncio enquanto observava os arredores; aquela escuridão terrível turvava meus sentidos. Um breu cuja origem só poderia ser o inferno. Quando, pelo tato, encontrei a maçaneta de alguma porta, abri-a de imediato em busca de quaisquer evidências que me sinalizassem o lugar em que eu estava. Sim, eu tinha uma lanterna. Quando você mata pessoas com certa frequência, você evita a luz e busca as sombras, naturalmente.

A porta rangeu como um espírito esquálido. Sua madeira era pesada e seu movimento lento; aquilo era mais bizarro do que pode parecer, pois eu estava em uma cabana e não em um antigo mausoléu. Mais escuridão. Adentrei-a sem hesitar, então vi uma chama vívida e trêmula. Olhei para traz e nenhuma porta encontrei, meu único destino era seguir, embora eu questionasse minha sanidade naquele momento. “Lars…” — Ouvi. Um sussurro anômalo, feminino e lânguido. Segurei meu revólver com uma fugacidade brutal. Seja quem for, se sabe meu nome, deve morrer. — Essa era uma das minhas regras. 

Era impossível ouvir meus passos. Apontava a pistola em todas as direções que eu olhava. O silêncio era denso e a escuridão era quase perpétua, pois alcancei a chama frágil em um castiçal sobre uma escrivaninha; isso me permitiu olhar bem para cada detalhe. Eu não estava na cabana. Aquele lugar possuía paredes de pedra bruta, mobiliário antigo, poeira, longos corredores. O castiçal era de bronze. Abri as duas gavetas da escrivaninha e o que encontrei em uma delas fora um livro. “A Divina Comédia”. Então ouvi passos à direita. Longínquos passos. “Que porra é esse lugar?” — Questionei a mim mesmo, talvez em busca de ouvir a minha voz para ter certeza de que eu não estava sonhando.

Texto publicado na 8ª edição de publicações do Castelo Drácula. Datado de agosto de 2024. → Ler edição completa

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