Os irmãos Winsttein
— Não renuncie a tua descendência, Bellanna Winsttein! — Proferiu Dhiego, seu irmão. Bellanna o olhou furiosa.
— Sabes que não o faço, apenas questiono a tua pretensão… — Dhiego sorriu.
— A arte, querida Bella, requer vida e morte, tu sabes… — Bellanna pretendia argumentar, todavia, Dhiego aumentou seu tom de voz ao notar que seria interrompido, Bellanna, portanto, recuou bufando. — Tu sabes que para termos o pigmento da morte, precisamos nos aproximar dela sem sucumbir às suas cores pútridas e tão fascinantes!
— E o fazemos, Dhiego! Papai está morto naquele quadro! — Bellanna apontou para o quadro à esquerda, na parede da sala. A moldura marfim fora esculpida com os ossos do falecido, a tela foi costurada com a sua pele e, pelas mãos hábeis de Dhiego, o sangue e a carne tonalizaram as nuances do retrato. Dhiego deu de ombros ao ouvi-la. — Não é suficiente para ti?
— Poderia ser… mas nunca ouvimos um Winsttein sequer pintar a si mesmo sem que tivesse de beijar os lábios mórbidos da morte…
— O que estás dizendo, Dhiego!?
— Pinte-me ainda vivo! Retire alguns ossos desnecessários, rasgue-me a pele, retira-me o sangue! Todavia, mantenha-me vivo.
Os olhos de Bellanna se arregalaram na surpresa da proposta de seu irmão, que loucura aquilo lhe parecia! Mas, Bellanna rapidamente se sentiu intrigada com tal horrenda possibilidade — afinal, era uma Winsttein. Deixou-se, portanto, idealizar a imagem de sua própria pintura, ao lado de seu irmão, sendo eternizados em morte, sem que morressem de fato.
— Uma… exposição… —Murmurara Bellanna, olhando ao derredor, sonhando. — Apenas aos críticos, aos familiares… tu e eu, Dhiego! Arrancando-nos partes de nossos corpos e pintando de imediato o nosso próprio retrato. E, então, finalizá-lo antes de nossa morte…
— Porque, se vivos no término, já teremos o legado… — Completou Dhiego, extasiado com a ideia. Ambos se olharam.
— Que assim seja! — Proferiram sorrindo.
A macabra exposição masoquista aconteceu como previsto e os irmãos Winsttein nunca foram esquecidos. Morreram minutos após o término do quadro e os seus gritos — dizem aqueles que lá estiveram — foram gritos hórridos, lamúrias atormentadoras e gemidos lascivos, tudo tétrico tal como as cenas mais atrozes de mutilação e tortura. Sorriam, contudo, a quase todo o instante; sentiam o prazer do maior de todos os feitos. Ninguém os interrompeu e seus filhos os assistiram bem à frente do palco — crianças tão pequenas. Todos os aplaudiram por minutos até o momento em que morreram no palco. Um silêncio, então, espargiu pelo anfiteatro até ser quebrado por uma terrível e grave voz que disse: “Bravo!” entre aplausos longos e mórbidos.
Até hoje, ninguém sabe de quem era aquela voz e, acreditam, era da Morte que os assistia desde o início.
Texto publicado na Edição 12 da Revista Castelo Drácula. Datado de janeiro de 2025. → Ler edição completa
Escritora, Poetisa e Sonurista, dedicada à Arte da Escrita há mais de vinte anos. Formada em Psicologia Existencial, amante dos clássicos, fundadora do Castelo Drácula e autora de “Sete Abismos” e “Sonetos Múrmuros”. Sua literatura é densa e lúgubre, sempre imersa em reflexões humanas profundamente existenciais. No Erotismo, a autora se destaca por uma narrativa imersiva e intensa, voltada ao prazer vinculado à dor, além de um poético romantismo sensual…
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