Imagem criada e editada por Sahra Melihssa para o Castelo Drácula

O relato impressionante do inestimável amigo Capitão João ressoou no seu subconsciente como uma ancestral canção arcana, esquecida em eras estranhas. O velocímetro marcava 70 km/h — o que era consideravelmente rápido, dadas as condições da pista —; apesar das mãos trêmulas, segurou com firmeza no volante, pois esse trecho possuía muitas curvas sinuosas. Pelo retrovisor, viu a casa do amigo sumindo lentamente; prometeu a si mesmo voltar mais vezes. Observou também a união mística de céu e mar, fazendo desaparecer a linha do horizonte, causando uma inexplicável sensação de medo. Tivera a impressão de que o céu, repleto de estrelas resplandecentes, estava mais próximo da terra. Pensar nesta ideia lhe apavorou.

Tomé mergulhou cada vez mais em seus pensamentos, enquanto a minguante e turgida lua iluminava seu caminho. Finalmente, a descida chegou ao fim. Era meia-noite, de acordo com os ponteiros. Ansiava estar em casa; porém, ainda havia alguns quilômetros, e uma longa estrada reta se estendia até o horizonte.

Enquanto dirigia, notou o despencar da temperatura, presenciando a cortante brisa gélida tocar-lhe o rosto terrivelmente. Notou mais algumas peculiaridades, como o ar que havia se tornado mais viscoso e, mesmo distante da praia, — o cheiro ainda permanecia ali, a assombrá-lo. Os ventos também trouxeram uma suave bruma, que surgiu tal qual uma aparição fantasmagórica, flutuando pela escuridão.

Com o vento soprando, Tomé assistiu, com olhos vestidos de horror, à bruma ganhar estranhos contornos. Os faróis amarelados deixavam tudo etéreo. Lembrou da nefasta imagem da ponte descomunal, assim como esta estrada.

Escutou nitidamente a melancólica voz de João, seu amigo, recitando Shakespeare, ecoando em sua mente. Esta lembrança o fez virar bruscamente, pois era como se alguém estivesse no banco de trás, sussurrando a citação — mas encontrou o vazio.

Seu peito batia em desassossego. Observou o céu novamente: as estrelas pareciam se aproximar ainda mais. Uma terrível sensação de estar sendo observado tomou conta dele. “Preciso manter a calma”, pensou. Novamente olhou para o retrovisor — a escuridão parecia devorar o que ficou para trás.

Precisava parar. Puxou devagar o freio. O carro derrapou em meio à neblina; o som dos pneus ressoou naquele lugar. Respirou fundo. Passou a mão na testa que gotejava medo. Saiu do carro, respirou fundo outra vez. Viu algo inexplicável — a impressão que tivera se concretizou. Aquela visão era inconcebível. Ficou na frente dos faróis e, em seguida, caiu de joelhos, as mãos na cabeça. Em sua frente: a imensidão.

Não havia nada que Tomé pudesse fazer, a não ser contemplar o irreal. Desejou ter uma câmera fotográfica para registrar aquele medonho espetáculo. Nenhum ser humano deveria presenciar aquilo. As brumas se tornaram mais densas, adquirindo formas grotescas; elas bailavam terrivelmente, alcançando alturas inimagináveis.

Passou a ouvir sons demasiadamente longínquos, porém não demorou muito até que se aproximassem com rapidez. Trêmulo, ouviu o que pareciam ser incontáveis vozes de diferentes tons, mas unidas. Eram semelhantes a um tenebroso trovão rasgando a imensidão do firmamento.

Tomé se perguntava se aquilo era fruto de um delírio causado pelas histórias impressionantes do amigo. Mas aquela visão era tão verossímil quanto o vento gélido e pútrido tocando seu rosto. Sua mente ínfima não iria suportar aquela visão. Seu corpo estava prestes a entrar em colapso, quando vislumbrou nuvens se aglomerando, formando imagens colossais, incompreensíveis. Gritos emanavam de suas entranhas.

Seu corpo não aguentou. Antes de entrar em colapso, viu dois olhos titânicos, flamejantes, clareando o céu — a mesma visão que seu amigo e exímio Capitão João tivera.


Escrito por:
Pablo Henrique

Pablo é um escritor nascido no Nordeste do Brasil, em João Pessoa. Possui uma escrita bastante carregada em angústia, com a essência do terror, horror e ultrarromantismo. Sua paixão pela Literatura Gótica começou na infância. Algumas de suas referências literárias são: Mary Shelley, as irmãs Brontë, Agatha Christie, Edgar Allan Poe e William Shakespeare. Pablo Henrique também é artista visual... » leia mais
16ª Edição: Soramithia - Revista Castelo Drácula
Esta obra foi publicada e registrada na 16ª Edição da Revista Castelo Drácula, datada de maio de 2025. Registrada na Câmara Brasileira do Livro, pela Editora Castelo Drácula. © Todos os direitos reservados. » Visite a Edição completa.

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