O Lago
— Alertei para ele não ir até lá... — disse Marcos, equilibrando seu corpo inebriado na banqueta, os cotovelos apoiados na bancada de madeira, lutando para não cair. Sua voz, inaudível, soou um tanto fantasmagórica enquanto contemplava o vazio através de seus olhos verdes.
— Até hoje sou assombrado por aquele horrendo entardecer... — Após proferir tais palavras, um silêncio perturbador reinou naquele bar.
Enquanto isso, Carlos, que lustrava a bancada, ouvia com temor cada sílaba, pois aquele terrível acontecimento ainda lhe causava calafrios.
— Por Deus, Marcos, temos visitantes na vila; é melhor não abrir a boca, entendeu? Todos nós avisamos sobre os perigos daquele lago, e mesmo assim... ele sorriu e foi ao encontro daquelas turvas águas. Ele tinha um ego maior que o temível Kraken — concluiu ele, servindo outra dose para Marcos.
Nesse momento, alguém com passos leves se aproxima e ouve parte da conversa. A princípio, eles ignoram, mas o cumprimento do visitante faz os homens despertarem daquele estado letárgico.
Nesta época do ano, a vila recebe muitos turistas por conta de um festival tradicional de frutos do mar, com os mais diferentes pratos, gerando muita renda para o comércio local. As águas cristalinas da praia eram belíssimas, o céu sempre azul-marinho, e o sol radiante era um espetáculo para os olhos.
Após as formalidades, o visitante entrou e pediu uma cerveja. Carlos o serviu, e o homem, que dizia ser um pesquisador, explicou que estava ali para escrever uma matéria para uma revista.
— Mas que belo lugar este, não é? — disse Pedro, o visitante. — Desculpem minha curiosidade, mas ouvi boa parte da conversa, e... os fatos narrados são verdadeiros? Digo, é uma história bastante assustadora.
Os homens se entreolharam com temor antes de responder.
— Aquele lago é amaldiçoado — iniciou Marcos, em um tom que falhava, como se revelasse algum segredo macabro.
— Crescemos ouvindo histórias sobre o lago. Diziam que, uma vez que você entra nas turvas águas, nunca mais será o mesmo. Acontecem mudanças físicas que tenho pavor em mencionar.
— Que mudanças? — perguntou Pedro, intrigado.
— Após três dias — disse Carlos, sussurrando — a pele se transforma, adquirindo um aspecto viscoso. Com o avançar dos dias, a pele desaparece por completo, e em seu lugar, escamas surgem dos poros. E então um cheiro pútrido e desagradável começa a ser sentido em certas horas... e os olhos... — Neste momento, um terrível arrepio percorreu os três. — Meu Deus, os olhos... ficam vazios, mortos, e o corpo se torna uma espécie de aglomerado acinzentado.
Absorto, Pedro escutou com muita atenção e pensou consigo mesmo: “Será que tal relato é verdadeiro? Mas por que razão esses humildes homens haveriam de mentir? Suas feições vestem o verdadeiro horror.”
Ainda espantado, Pedro disse:
— Eu já ouvi muitas histórias estranhas nesta vida, mas nada se compara a esta. Se me permitem, será que eu poderia escrever uma matéria?
Os homens tremiam e olhavam ao redor enquanto engoliam as lembranças com o álcool.
— Acho que sim — um deles falou, enquanto o outro admirava o copo vazio com um olhar perdido. Pedro insistiu, e eles aceitaram. Mas antes de se despedirem, Carlos falou:
— Se você tem amor à sua vida, vá embora o quanto antes. Sei que é dia de festa por aqui, mas aconselho você a ir.
Pedro caminhava pela rua com aquela história na cabeça quando uma forte brisa tocou seu rosto, desarrumando seus cabelos pretos e trazendo consigo um odor pútrido, igual ao que acabara de ouvir. Procurou seu carro e acelerou o mais rápido possível.
Texto publicado no Desafio Sombrio 2024 do Castelo Drácula. Em outubro de 2024. → Ler o desafio completo
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