5 Minutos

Imagem criada e editada por Sara Melissa de Azevedo para o Castelo Drácula
Tenho que acordar todos os dias às 7h da manhã. Mas levantar cedo nunca foi meu forte. Para que eu consiga, de fato, despertar até o horário em que devo sair da cama, programo meu celular para despertar de 5 em 5 minutos. Ele começa às 5h e termina às 7h05, quando já estou 5 minutos atrasada.
Minha mãe sempre briga comigo porque acha que isso é coisa de maluco. Mas faço isso há tanto tempo que, se programar o alarme apenas uma vez, tenho certeza de que nem o ouço. Por isso, meus pais sempre reclamam: “Fica um barulho chato de 5 em 5 minutos até que você resolva desligar”, blá, blá, blá. Até alguns vizinhos já vieram reclamar, mas tente alguma vez, dá super certo!
Uma amiga da faculdade duvida da minha teoria. Mas é tão certa quanto um mais um é igual a dois. Para provar a ela, propus um desafio. Na sexta-feira, às 8h, teremos prova de Cálculo, mas na véspera irei a uma balada com meu namorado e devo retornar por volta das 3h. Chegarei no horário e sem sono!
Primeira parte do desafio cumprida. Bebi um pouco a mais, confesso. Mas é só tomar uma ducha rápida e dormir. Celular programado — em poucas horas, provarei que tenho razão no meu método.
"BIP BIP BIP!"
— De primeira! Dessa vez, acordei no primeiro alarme, mal posso acreditar! E ainda por cima, sem sono; vou até desativar o próximo... PUTA QUE PARIU!
Não poderia ser. Não poderia! Justo hoje! Como eu não ouvi? Eu sempre ouço! Transtornada, meus pensamentos não paravam. Já eram 8 HORAS! Nunca isso havia me acontecido. Vesti a primeira roupa que encontrei, coloquei meus chinelos mesmo, escovei os dentes, puxei a mochila e saí correndo de casa.
Cheguei na porta da sala de aula faltando 5 minutos para as 9h. Perdi a prova.
— Perdeu a aposta! — Minha amiga passou por mim com tom de deboche. Ignorei e entrei para não perder a aula seguinte.
— Cibele! Cibele!
Ouvi chamarem meu nome ao longe, mas foi só quando me sacudiram que despertei.
— Julia! O que foi?
— O que foi pergunto eu. Sua teoria literalmente caiu por terra. Você perdeu a prova e dormiu em todas as outras aulas.
Olhei para meu celular: eram 12h05. Levantei assustada.
— Não pode ser!
— Claro que pode! Só você para acreditar que abusar da função soneca é algo que realmente funciona!
Estava tão perplexa que o sarcasmo da minha amiga nem me afetou. Eu já havia feito a mesma coisa por diversas vezes, e sempre funcionou.
Com o passar dos dias, não conseguia mais compreender o que de fato estava acontecendo. Mesmo acordada, bastava me dar um leve sono para que horas se passassem. Mas sempre o número 5 estava presente. Às vezes não me dava conta de que havia adormecido; olhava para meu celular, e o relógio parecia ter enlouquecido. Até que se passaram 5 dias, 5 semanas...
O tempo escapava de mim como se eu vivesse em um eterno e maldito modo soneca. Um bocejo que fosse era o suficiente para o ativar. Troquei de celular, tentei relógio, despertador analógico, até mesmo não manter mais nada perto de mim. Sem sucesso.
Há 5 minutos saí do consultório médico. Tenho algum tipo de problema que ainda está sendo investigado. A previsão é que resultados satisfatórios sejam encontrados em torno de 5 anos. Hoje desperto há exatamente 5 dias para que se completassem os 5 anos previstos para algum progresso no tratamento de minha enfermidade. Mas despertei apenas a tempo de ver que desligavam os aparelhos que me mantinham viva.
— Hora da morte: 5h55.
"Biiiiiiiiiiiiiiiiiiiii..."
Texto publicado no Desafio Sombrio 2024 do Castelo Drácula. Em outubro de 2024. → Ler o desafio completo
Ana Kelly, natural de São Paulo (SP), é poeta, escritora, contista e artesã, sócia-proprietária da loja de acessórios e artigos alternativos, Ivory Fairy. Tem poemas e contos publicados como co-autora em diferentes antologias. No ano de 2009 recebeu o prêmio de 1º lugar, em um concurso de poesias do tema “Natureza”, do Projeto Chance, no Centro de Educação Unificado ( CEU ) em Paraisópolis. Organizadora da segunda Semana Literária Digital de 2023…
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