Emanação Violácea

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Ao abrir a porta, não consegui enxergar muito bem, mesmo com a visão de vampira, me senti como a míope que fui outrora antes da cirurgia, graças aos hospitais que fizeram um desconto… deixado um pouco de lado as minhas divagações, consegui sentir um cheiro… inebriante… totalmente diferente do cheiro de mofo que senti ao adentrar no castelo.

Percorri um longo caminho até aqui e, para a minha surpresa, ainda não cruzei meu caminho com o anfitrião. Eu sou apenas uma subordinada de algo maior, perdida num castelo com o meu gato. E se por algum momento eu cogitei tal façanha, não posso negar que experienciar essa jornada no castelo do Drácula, que já li no período escolar, faria algum sentido em minha “vida” pessoal. O vampirismo me trouxe diversas faces e eu me sinto sazonal em muitos momentos. Mas nessa sala em que me encontro tem um cheiro que me tortura e ao mesmo tempo me encanta.

Por que não consigo enxergar?

“Jason venha até aqui e pule nos meus braços, iremos nos guiar pelo cheiro que, parando para pensar de forma mais racional, me lembra muito nossa estalagem das lavandas.”

Quando fomos transformados em vampiros naquele lugar, o dia da minha morte e renascimento ao lado de quem mais amo, eu não podia imaginar que a lavanda — a flor que sempre me trouxera paz, a calmaria que me guiava nas noites de escritora virada por dias seguidos — seria tão presente nesse meu caminhar imortal. Agora sua cor e seu cheiro me transbordam tantos outros sentimentos, me levam ao mais profundo abismo de mim mesma e me inebriam algures.

Existe uma névoa intensa nessa sala e agora meus olhos estão se acostumando e o odor que percorre em minhas entranhas, me desliza caminhando para um ponto que tem uma outra porta. A madeira tem um toque de carvalho que acredito ser seu material.

“Devemos entrar Jason?” 
“Miau”

Somos vampiros e, mesmo que imortais, estamos suscetíveis a uma outra morte. Se o Drácula aqui estiver, outros devem existir, sejam outros seres sobrenaturais ou outros como nós. Minha intuição diz que há outros vampiros e outros que possam ser futuras vítimas. O desconhecido nem sempre me encantou, vivi anos na monotonia de uma vida pacata com os amigos e meu gato. A curiosidade me despertou para esta “vida” e o amor que percorre em minhas veias resplandece nessa realidade gélida e nesse castelo assombrado. Meu coração padece dessas indagações momentâneas e giro a maçaneta.

Meus olhos descortinados agora vislumbram uma sala violeta e o aroma ainda é como um bálsamo, se isto é que me trouxera até aqui, preciso entender os fundamentos compostos desta sala. Essa cor que me lembra as lavandas…

Assim como o “violeta” está ligado ao nosso chakra coronário, irei me interligar com a minha espiritualidade. Quem diria que eu, uma vampira, ainda poderia me guiar por coisas tão humanas e entender o significado proposto dessa sala que é a cor referente a essa ligação interior.

“Venha Jason, vamos olhar por trás de cada quadro em busca de algo.”

E esse cheiro? Não sai do meu alcance, preciso examinar o ponto exato de sua emanação ou se está presente na sala inteira. São tantos quadros que iremos levar algum tempo, são todos de épocas diferentes e isso confirma meus pensamentos de antes. Será que em breve iremos encontrar alguém?

“Miau”

Texto publicado na 3ª edição de publicações do Castelo Drácula. Datada de março de 2024. → Ler edição completa

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