Astrid


AI
25 de maio de 1880
Querido diário, mais de dois meses se passaram e eu continuo confinada neste terrível castelo. Acredito que ficaria louca caso não o recebesse em minhas mãos. Deves saber que és um presente do querido advogado do Lorde Drácula, este gentil senhor salvou minha vida diante deste terrível destino que decaiu sobre mim.
Papai jamais esteve de acordo com minha instrução de conhecimento, todavia jamais acreditei ser capaz de concordar com tal sandice como mandar-me para o castelo de um de seus clientes localizado no centro da Romênia. De qualquer forma, registrarei toda minha história neste belíssimo encadernado de couro vermelho, para que caso minha vida seja extinguida, saberem a verdade.
O começo de minha história é dado com uma falsa acusação sobre mim em um colégio. O colégio interno público para jovens moças dirigido pela Igreja católica fornece aos alunos uma educação passiva, apesar da rigidez dos documentos burocráticos, redigido por nossos bem feitores, que deixavam claro suas opiniões contrárias à construção de uma educação áspera e de caráter hierático.
Após a eminente falência de minha família, fui transferida de meu querido colégio na França a esse menos privilegiado, mas muito conhecido por dar ênfase ao ensino da agricultura, onde nós éramos diferenciadas entre nossas condições sociais, jurídicas e étnicas, separadas em filhas legítimas e ilegítimas de aristocratas falidos, ou incapazes de se submeterem a uma relação monogâmica em seus casamentos arranjados, misturando assim a pureza de seu sangue. Estávamos no meio de uma revolução contra o governo imperial, mas uma revolução ainda maior estaria prestes a se instalar dentro do meu peito.
‘’Desmanche essa cara de suplício, Astrid. Levante-se e vá se aprontar como as outras moças.’’
Dizia sempre irmã Filipa.
Eu a obedecia, mas o meu suplício tão evidente existia somente devido a dor de haver perdido tudo que eu julgava mais importante no mundo, e quando digo tudo, expresso a totalidade dos bens os quais acreditava serem puramente meus por direito, como nosso precioso Château em Val de Loire, onde eu costumava descansar em meus recessos de finais de ano, com minha mãe e nossas criadas. Saudade dos meus belíssimos vestidos de algodão e lindos chapéus repletos de flores e fitas, nada comparados a simples vestimenta de peça única, que obrigatoriamente trajávamos no colégio, em razão do caimento nos proporcionar a praticidade esperada em nossas tarefas no campo. Mais para frente eu descobriria que há coisas mais preciosas do que bens materiais e memórias distantes, construídas em cima de segundos de total cegueira ao afeiçoamento alheio.
Perdida em meus pensamentos eu observava minhas colegas, apesar das condições simples em que vivíamos, eram felizes, rodopiavam, deixando irmã Felipa aborrecida, pois, eu era solitária, a garota desprezada, chamavam-me de ‘’A burguesa’’, eu apenas aceitava enquanto lutava para não chorar. Oh quantas vezes eu estive em prantos, rezando a Deus para me ceder um pouco de paciência, que minha angústia cessasse, no mínimo por mais um ano, ou eu cairia nas graças da morte pelas minhas próprias mãos. Eu entendo, os meus motivos eram superficiais, mas nada do que me diziam aliviava a dor de ainda estar viva.
‘’Termine suas lamentações e vá conversar com a irmã Celeste, ela está a sua espera na ala leste.’’
Ordenou outra irmã, consenti com a cabeça, repassando os diálogos, não havia muito o que dizer à Irmã Celeste que continuasse a prolongar minha imagem passiva, distanciando de seus pensamentos a falsa acusação contra mim, caso não ocorresse agradava-me muito a ideia do meu provável suicídio.
Tenho certeza de que minha expulsão fora arquitetada por Blanca, uma das internas, a fantasmagórica figura de cabelos curtos encrespados e tez pálida, Blanca sempre me causou medo ao transitar na madrugada entre os leitos, tocando os lençóis com as pontas dos dedos alongados.
Desde minha chegada ao castelo pouco vi o conde, conversamos brevemente em seu escritório em uma apresentação formal. Agradou-me muitíssimo sua aparência pálida, esguia, lábios pequenos e nariz aquilino, tal como seus modos aristocráticos e bonitos trajes antiquados. Nossa pequena interação durou alguns minutos, porém fora o suficiente para que eu tencionasse vê-lo novamente, sei que somente ele poderá convencer papai de minha volta para casa, da mesma forma interromper os terríveis sons que se ralham durante a madrugada.
Em breve registrarei mais de minhas impressões sobre minha nova residência funesta. Devo recolher-me por agora. Boa noite, único amigo.
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