Texto e cena: Dramaturgia e narrativa — o teatro como linguagem da vida

Imagem criada e editada por Sahra Melihssa para o Castelo Drácula

“...quero indicar sobretudo que
para mim o teatro é ato e
emanação perpétua, que nele
nada existe de imóvel, que o
identifico com um ato verdadeiro, portanto vivo, portanto mágico.”

Sobre teatro e literatura – os desafios do autor em materializar as imagens postas no papel. O teatro consiste em encenar; assim como a vida, quando se assume um papel social. O professor que sai de sua casa, cambaleante, de porre, logo cedo, para contribuir com o belo quadro social, ou a médica, com sua pretensão altruísta de salvar vidas – ou por horas apenas. E assim por diante.

A palavra se desnuda no contexto, na encenação dos gestos e da presença. Quando o teatro vira ação, o espaço cênico ganha novos desdobramentos: o tradicional se dissolve e se estende do convencional ao cotidiano, que ganha corpo e performance, que transforma o espectador em ator ou autor, que assume postura em várias dimensões da vida, como o trabalho, a casa, a rua…

O espaço, como desdobramento do enredo teatral no mundo, também pode ser encontrado no instrumento de investigação – o Organon, de Bertolt Brecht – no seguinte: “O Teatro consiste nisto: em fazer uma viva representação de fatos acontecidos ou inventados entre seres humanos e fazendo-o com a perspectiva da diversão. De qualquer modo, é o que buscamos tratando de teatro novo ou antigo.” A apresentação se emancipa do palco, ganhando suas dimensões mais carnais – para além das páginas. A atração é ética e política, pois cria ação e propicia espaço para o espectador participar ativamente.

O teatro nasce da palavra, mas não se encerra nela. A escrita não busca apenas ser lida: ela quer corpo, gestos, quer ter voz e símbolos visuais pulsando ritmo e presença. Pintar o mundo para além do grafite. Os diálogos não são meros riscos se entoados através das gargantas. O diálogo é potência, como no Teatro do Oprimido ou das Oprimidas:

Como é que a gente pode, através da visão crítica da sociedade, da visão crítica que a gente tem sobre o real, representar esse real e buscar a conversa, a troca de ideias, a troca de experiência sobre esse real? Ou seja: eu vivo o real, olho para o real com olhos críticos, represento o real e me pergunto: ‘Como é que a gente pode transformar isso mais prático, melhor? Como é que eu posso transformar esse real em uma realidade que seja mais acessível para mim, que seja melhor para a minha vida?’ O diálogo significa que a gente está aberto o suficiente para escutar um ao outro.

É na conversa entre gestos, expressões e palavras que se constroem pontes necessárias para transportar as transformações sociais que se deseja. Um espaço utópico de resistência.

A mão-de-obra não termina no papel. A literatura se rende ao palco sem perder seu brilhantismo. A palavra se põe pornográfica e se deixa ser tocada pela ação direta. Ela mesma penetra na pele como um espírito, contorce o artista, enche de lágrimas a plateia que se envolve na trama. Ali começa o seu prolongamento: o traço mais generoso de riscos a correr.

A teatralidade está na surdina mais exposta. O espectador não é mais passivo: vira autor – e da própria vida – nos demais convívios e espaços sociais, numa reunião enfadonha, na sua labuta diária ou mesmo com a família. É encontro de raças, gêneros e classes. Mesmo os desavisados sempre atuam com um “prazer de nível superior”, como escreve Brecht, acrescentando que:

“Por esta forma superior de prazer, o teatro leva seu público a uma atitude fecunda, para além do simples olhar. No ‘seu’ teatro, o espectador poderá divertir-se, como se tratasse de um recreio, com tremendas e infindáveis canseiras que lhe dão a subsistência, e com o pavor que lhe inspira a sua interminável transformação. Num teatro deste tipo, o público tem a possibilidade de educar a si próprio da maneira mais simples; de existência, é a arte que a proporciona.”

Dessa forma, o teatro também ensina a estar no mundo. A escutar e a dizer. A atuar. A ter mais presença. O palco se transforma em qualquer lugar de potência da vida: espaço físico e psicológico. O texto precisa de carne, a carne de movimento, e a alma, de florescer.

Revisão de Sahra Melihssa

Escrito por:
Tiago Serigy

Tiago Serigy é amante de filmes, pinturas e desenhos, músicas, além das letras, tem escrito sonetos (mais de 100), prosa poética e versos livres ao longo de mais de uma década, também tem um compilado de contos eróticos e crônicas. Uma fonte que jorra palavras para reinterpretar a brevidade da vida na tentativa de “não seja imortal posto que é chama, mas que seja infinita enquanto dure”. É uma pessoa... » leia mais
18ª Edição: Theattro - Revista Castelo Drácula
Esta obra foi publicada e registrada na 18ª Edição da Revista Castelo Drácula, datada de agosto de 2025. Registrada na Câmara Brasileira do Livro, pela Editora Castelo Drácula. © Todos os direitos reservados. » Visite a Edição completa

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