Desperta
Quão amarga é a solidão do silêncio absoluto, o abismo que sangra em palavras mortas. Meus olhos fitam meu retorno, e de repente vejo o nascer das trevas em meu peito, a poesia da escuridão ao lado do horizonte noturno. O espírito da finitude não beija meus lábios, de alguma forma eu sei disso. Despertei pela fresta de luz de um luar brando e vívido. Lembrei-me dos caminhos que fiz pelos sonhos mais frígidos e sei que atravessei cordilheiras distantes e precipícios símeis aos pélagos úmidos e aos arvoredos orvalhados.
A poeira ao redor sobre os lençóis de cetim escarlate, o espelho embaçado, as teias tecidas com esmero pelas aracnídeas cuja natureza é fascinante e silente. Estou acordada. O mundo humano ainda é o mesmo? A lua ainda reside no firmamento, embora as estrelas aparentem estar muito mais distantes do que outrora. Apoio-me no balaústre da varanda, quão alta esta torre se faz… posso ver o abismo e todos os pinheiros negros ao redor, junto à parte do castelo que está tomado por neve e galhos secos, sinto — enquanto estremeço — a brisa internamente densa em sua gélida composição. É inverno. Pela palidez que cai a neve em lentidão, não tenho dúvidas que estou no ápice da estação mais frígida. Quantos anos se passaram? Por que não envelheci?
Não ouço nada além do sibilar mórbido da aragem estonteante, e dos corvos a crocitarem tristes vez ou outra. Tenho pouquíssimas memórias, sinto-me como n’um nascimento prematuro, ainda entranhada em reminiscências do ventre em suas sombras, calidez e sons imprecisos, nada mais. Ainda não me fiz destrancar este umbral que me separa dos recônditos obscuros d’este lugar, pois temo — eis a razão desoladora. Do fogo que acendi na lareira umedecida, emergiu-me uma imagem efêmera de olhos escarlate e uma intensa dor em minh’alma, então senti minhas pálpebras estafantes, adormeci serena e lôbrega nos braços de alguém que não me lembro o semblante. Agora escrevo, porque posso não sentir a vida ebulir em minhas veias, mas sinto as mais fúnebres emoções que a ela pertencem.
Escritora desde a infância, fascinada e dedicada à Arte da Escrita há mais de vinte anos. Formada em Psicologia Existencial, amante dos clássicos, fundadora do Castelo Drácula e autora de “Sete Abismos” e “Sonetos Múrmuros”. Sua literatura é densa e lúgubre, sempre imersa em reflexões humanas profundamente existenciais…
Leia mais desta autora:
Quão amarga é a solidão do silêncio absoluto, o abismo que sangra em palavras mortas. Meus olhos fitam meu retorno, e de repente vejo o nascer das trevas…
No erguer-se do luar alcantilado | Crocita um corvo enquanto sou lamúria | Assusto-me e o percebo afortunado, | Pois voa contra o vento da penúria;…
Edgar Allan Poe é o Mestre da narrativa macabra e do mistério, deixou um legado literário…
“Angústia vil… sou rígida fereza… | A morte lacrimal de teu semblante… | Tormento me convida à tua pureza | Olvidas-me a pensar ser delirante…”
Ohropo desperta ao entardecer e enquanto seus olhos se tumulam no precipício, um corvo de olhos pútridos crocita infeliz; a alma de Ohropo, em partes, obliterada…
Co’as pálpebras cerradas… eu mui sinto | “Evoque à tua memória em meninez | Ao leito d’uma morte…” — ouço e pressinto | “Brutal que preservei tua languidez…
Atento o meu olhar “Quem és, ó Dom” | Indago n’agonia em mim crescente“ | Herói que salva ou mal que ofende o ambom? | Por que me causas mágoa caulescente…
Ouviu Dama Sonura a lacrimar | Com alma e solidão, preces soturnas, | Ao sopro d’um abismo à chuva-lar | Que dela faz as letras tão noturnas;…
A morte-rubi me espreitando | E o choro adornado de medos, | Escuro-carmim sufocando... | Dois olhos me incitam segredos...
Ao Memórum pertencerá a sua vida em todas as instâncias emocionais e psíquicas…
Sonhei que caminhava | Por longo bosque escuro | E o vento mui soprava | Nas breves, vãs, clareiras | Ardores inseguros…
Morrer é o que nos caracteriza e a morte é significativa para todas as instâncias da vida. Na Fenomenologia estuda-se a…
Trees of Eternity foi uma colaboração musical entre o guitarrista finlandês Juha Raivio e…
Como Escritora, tenho inúmeros semblantes, sempre em busca do lírico, do intenso e do profundo. Como Poetisa, tenho a eterna sensibilidade e a vívida paixão. Como pessoa comum, sou mais uma na multidão em busca de compreender a si mesma. SAIBA MAIS
Um flúmen carmesim cruzava o níveo balcedo e, deste liquor consistente, eu me inebriava, sorvendo sem temores, e imergindo-me nua em seu sereno caudal…